O Brasil e a Ferida Aberta da Polarização

O Brasil e a Ferida Aberta da Polarização




Por: João Pedro de Carvalho Tozatto

Há uma febre silenciosa que arde no Brasil. Não é a febre das doenças tropicais, tampouco a dos verões intermináveis. É uma febre política, social e até emocional, que se organiza pelas ruas, pelas mesas de jantar e, sobretudo, pelas arenas invisíveis das redes sociais. Essa febre atende por um nome que já não causa estranheza: polarização .

Não é de hoje que divergências de ideias movam o mundo. O problema é quando a diferença deixa de ser combustível para o debate e passa a ser combustível para o ódio. No Brasil, a polarização tomou proporções que extrapolam a política. Tornou-se identidade. E, quando ideias viram bandeiras feitas como se fossem a própria alma, qualquer crítica se transforma, para muitos, em ofensa pessoal.

O resultado é visível: famílias que evitam reuniões para não discutir política, amizades românticas, vizinhos que se tratam como adversários e um espaço público contaminado por insultos. A imprensa, por vezes, é vista não como mediadora, mas como parte do campo de batalha — e, nesse campo, a verdade perde espaço para narrativas convenientes.

As consequências de um país dividido

A polarização estreita de horizontes. Em vez de buscarmos soluções complexas para problemas igualmente complexos, reduzimos tudo a uma disputa entre “nós” e “eles”. Isso alimenta um ciclo perigoso: governantes que governam apenas para sua base e opositores que torcem pelo fracasso do país apenas para provar um ponto. A economia sofre, a confiança nas instituições se esfarela e a sociedade se acostuma a viver sob constante tensão.

Na prática, a polarização produz imobilismo. As reformas urgentes ficam engavetadas, os investimentos se retrocedem diante da instabilidade e as políticas públicas se tornam reféns de interesses eleitorais. É como se estivéssemos em um barco onde metade da tripulação rema para frente e a outra metade rema para trás — e todos se surpreendem quando não saímos do lugar.

Para onde estamos indo?

Se a trajetória atual se mantiver, o Brasil corre o risco de se transformar num território onde o diálogo é artigo raro e onde a política é menos sobre governar e mais sobre vencer o próximo embate. Em democracias fragilizadas pela polarização extrema, cresce o espaço para líderes populistas, para discursos simplistas e para medidas autoritárias travestidas de soluções rápidas.

O destino mais sombrio não é apenas o empobrecimento econômico ou o desgaste institucional — é a degradação da capacidade de confiar em nós outros. E sem confiança, nenhuma nação se sustenta.

Um caminho possível

Talvez o antídoto não esteja apenas na política, mas na cultura. É preciso reaprender a conversar. Reconhecer que o adversário não é inimigo. Entender que a democracia, por essência, exige que convivamos com o desconforto das opiniões divergentes.

Isso não significa abrir mão de condenações, mas sim abrir espaço para a escuta. Significa aceitar que ninguém detém sozinho o monopólio da verdade e que, por mais que pareça, o Brasil não se divide entre santos e demônios — mas entre seres humanos, todos falhos, todos passíveis de erro e acerto.

No fim, a pergunta que fica é: queremos ser uma nação que construa pontes ou uma que ergue muros? A resposta talvez defina não apenas o boato da política brasileira, mas o futuro de nossa própria como povo.

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