OEA se omite diante de ataques de Trump ao Brasil, temendo retaliações

OEA se omite diante de ataques de Trump ao Brasil, temendo retaliações

 Principal instância das Américas evita se pronunciar, por receber de perder financiamento e se tornar alvo de hostilidades



Donald Trump e Lula. Fotos: Evaristo Sá/AFP e Brendan Smialowski/AFP

Porto Velho, RO -  A Organização dos Estados Americanos (OEA) evita debater as ações do presidente americano, Donald Trump, contra o Brasil. A inação deve ao temor de que, em retaliação, os Estados Unidos cancelem seus transportes financeiros ou simplesmente se retirem desta que é a principal organização das Américas. Além disso, há países que, individualmente, têm sido alvos de ações hostis da Casa Branca, um exemplo do que já acontece com o Estado brasileiro.

O clima de apreensão, tensão e temor na OEA foi relatado na CartaCapital por mais de um diplomata lotado na sede da organização, em Washington. Em conversas reservadas, ao longo da última semana de julho, alguns disseram temer que Trump se voltaria contra uma organização que, até agora, tem sido poupada dos arrobos que já fizeram os EUA cancelarem seus transportes financeiros a outras instâncias semelhantes, como a Organização Mundial da Saúde (OMS), sem contar a própria USAID, a agência americana para o desenvolvimento.

“A situação é muito grave”, disse uma das diplomatas, em conversa telefônica, na última quinta-feira 31. “O multilateralismo, de maneira geral, está sob a lupa de Donald Trump, e nós achamos que, nos próximos dias, ele deve se pronunciar sobre isso”, afirmou, referindo-se às críticas de que o presidente americano pode vir a fazer à organização, caso ela tome posições públicas simpáticas ao Brasil na disputa em torno das decisões que levam a tomadas sendo pelo juiz do Supremo Tribunal Federal Alexandre de Moraes contra o ex-presidente Jair Bolsonaro.

Os EUA são o principal financiador da OEA. Historicamente, os americanos responderam, todos os anos, por mais da metade do orçamento total da organização, que, em 2025, alcançou os 93,6 milhões de dólares . Uma interrupção abrupta dessas contribuições poderia significar o fim das atividades ordinárias da OEA, pois nenhum outro membro teria condições de preencher essa lacuna. Além da perda de financiamento, a OEA corre o risco de o governo Trump dificultar a emissão de vistos e a permanência de diplomatas dos 32 países-membros que têm assento na organização, cuja sede fica em Washington, a poucos metros da Casa Branca. Outro fator de preocupação diz respeito ao risco de que os americanos simplesmente deixem de fazer parte da OEA, esvaziando a única instância multilateral que abriga quase todos os países do continente americano; ou ainda que a Lei Magnistky ou outros recursos semelhantes podem ser usados para sancionar membros da organização, a exemplo do que foi feito contra o procurador-geral do Tribunal Penal Internacional (TPI), o britânico Karim Khan. 





Todos esses temores somados explicam, de acordo com esses diplomatas, o silêncio que a OEA mantém diante das ações hostis que Trump tomou contra o Brasil. O secretário-geral da organização é o surinamês Albert Amdin. Ele foi eleito para o cargo em 10 de março, com apoio inclusive do presidente brasileiro, Luiz Inácio Lula da Silva, para substituir o uruguaio Luís Almagro, que estava há dez anos no posto.

Embora Almagro tivesse sido chanceler do Uruguai no governo de Pepe Mujica, suas posições à frente da OEA foram se tornando cada vez mais alinhadas a Washington e contrárias a governos de esquerda na região. A troca dele por Amdin foi acompanhada da expectativa de que o surinamês pudesse mudar o rumo ideológico da organização, mas a eleição de Trump está jogando por terra essa expectativa.

Amdin teria poderes para exercer um papel de mediador entre Brasil e EUA. Essa seria uma saída diplomática que poderia ajudar a desescalar as tensões entre os dois países. Além disso, a própria Assembleia-Geral da organização poderia se manifestar sobre o episódio. O Brasil, provavelmente, apontaria trechos da Carta da OEA que estão sendo violados pelos EUA, como a obrigação de “respeito à personalidade, soberania e independência dos Estados”, assim como à “boa vizinhança” e ao “princípio de não intervenção”, entre outros.

A Assembleia-Geral é composta hoje por 32 países-membros. Se pelo menos 18 votassem a favor de uma moção com essa, o Brasil teria mais força para confrontar as hostilidades de Trump, mostrando que suas posições têm amplo respaldo regional. Entretanto, “o quadro parlamentar na OEA é hoje desfavorável a qualquer enfrentamento ao bullying”, disse um dos diplomatas.

O próprio Itamaraty ainda não tomou nenhuma ação em relação aos EUA na OEA. O Brasil não propôs nenhuma discussão na Assembleia-Geral, nem apresentou qualquer queixa em relação a Trump aos demais países-membros. A demora em acionar essa instância pode estar ligada à espera por um desfecho na política de tarifas aduaneiras que os EUA aplicarão finalmente ao Brasil. Embora Trump tenha lançado uma ameaça original de taxar em 50% todos os produtos brasileiros, ele vem recuando paulatinamente, reduzindo a lista de itens sobretaxados.

Outro fator que deixa o Brasil em clima de expectativa é o relatório aguardado para o fim de agosto ou início de setembro, produzido pelo relator especial para Liberdade de Expressão da Comissão Interamericana de Direitos Humanos (CIDH), Pedro Vaca.

O colombiano esteve entre 9 e 14 de fevereiro em Brasília, Rio de Janeiro e São Paulo para “colher informações sobre a situação da liberdade de expressão e seu impacto sobre os direitos humanos no País”. Na visita, Vaca manteve encontros com militantes da extrema-direita bolsonarista, que apresentaram queixas sobre decisões que vêm sendo tomadas pelos ministros Moraes no enfrentamento às milícias digitais

. reforcem o discurso de que o Brasil virou uma ditadura, o que acabaria justificando e reforçando as ações que já vêm sendo tomadas pelos

EUA .  

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