A quarentena, os lockdowns e o fechamento obrigatório do comércio causados por meses a fio na pandemia de Covid-19 em 2020 e em 2021 não conseguiram diminuir o perigo do trânsito do estado de São Paulo, que matou 13 pessoas por dia até setembro deste ano.
De janeiro a setembro de 2019, foram 4.028 mortes no trânsito. No mesmo período em 2020 e em 2021 foram 3.722 e 3.642 óbitos, respectivamente, o que representa uma queda de apenas 9,5% em relação a 2019. É o que revelam dados do Infosiga-SP, do governo estadual de São Paulo, compilados e analisados pelo R7.
Em 2021, com o avanço da vacinação e a redução do isolamento social, especialistas temem que, com a volta da movimentação ao nível pré-pandemia, a taxa de mortes piore após uma série de quedas consecutivas na série histórica — a nível estadual e nacional.
"Pode haver uma piora se não houver fiscalização e se não houver conscientização. As pessoas estão ávidas para sair e confratenizar e precisam ter em mente que álcool e direção não combinam", comenta o consultor de segurança viária, André Garcia.
Nacionalmente, os dados também demonstram pouco efeito da pandemia. Em 2020, segundo o DataSUS (Departamento de Informática do Sistema Único de Saúde), 31.088 perderam a vida em acidentes de trânsito, redução de 5% em comparação com 2019 (32.879). As taxas de 2021 ainda não foram divulgadas pelo governo federal.
"Alguns estados, inclusive, tiveram em 2020 um número de mortes de trânsito superior ao número de mortes por crimes violentos. São Paulo é um exemplo", diz o professor especialista e delegado da Polícia Civil do Paraná Henrique Hoffmann.
"Isso indica um estado de guerra civil no trânsito, já que é uma conclusão tirada quanto ao número de mortes por crimes violentos, porque o Brasil tem estatísticas correspondentes a países em guerra", completa.
Perfil das vítimas
O perfil das vítimas em São Paulo se mantém o mesmo mesmo ano após ano: homens jovens, entre 18 e 54 anos. Em 2021, foram pelo menos 398 vítimas nesta faixa etária até setembro. Entre os tipos de veículos, as motocicletas estão em 272 fatalidades e lideram as ocorrências de longe no mesmo período.
Já o tipo de via onde ocorrem os acidentes revela igualdade entre mortes em vias municipais (1.745), e as que ocorrem em rodovias (1.674).
O diretor executivo da Fenive (Federação Nacional da Inspeção Veicular), Daniel Bassoli, explica que o protagonismo das motos pode ter sido causado pelo impacto socioeconômico da pandemia nos empregos e serviços.
"O número da frota de motos cresceu desproporcionalmente por causa principalmente de questões econômicas. As pessoas precisam trabalhar. Os acidentes de motos não caíram como o esperado, e isso impactou neste número aquém do esperado", comenta.
"São pessoas que trabalham com entregas, sofrem com pressão de tempo, trabalham com condições ergonômicas ruins. Tem lei para proteger esses usuários, mas a resolução Contran 359 [sobre inspeção técnica em veículos] não é cumprida."
Vale ressaltar que a maioria dos registros do Infosiga não contém este nível de detalhamento que permita conhecer o perfil da vítima e do veículo. Neste ano, a informação é desconhecida em 2.989 dos casos (82% do total).
Evolução
Apesar do alto número de mortes atualmente, os registros vêm caindo nos últimos anos anos em São Paulo e no Brasil. No estado, as estatísticas abaixaram 24% desde o pico do série histórica estadual, que começa em 2015, e estão no menor patamar em 2021.
Para diminuir ainda mais os registros, especialistas afirmam que as ações de fiscalização e autuação são essenciais para o estado, já em situação melhor do que a média nacional, conseguir continuar abaixando as estatísticas.
Contra este movimento, argumentam, estariam políticas para diminuir o número de multas e aumentar o número de pontos para a perda da CNH (Carteira Nacional de Habilitação). "Você precisa ter um sistema estatal que puna de forma exemplar. Se o cidadão tiver certeza da punição, caso venha a cometer alguma falta, isso diminui bastante", diz André Garcia.
Metodologia
O R7 coletou os dados a partir da “Base Completa de Óbitos” do site Infosiga-SP. Diferentemente do que o órgão apresenta em destaque no seu site, o R7 não filtrou para o levantamento apenas os óbitos que ocorreram em até 30 dias depois do acidente.
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