Clarinha: Um dia antes da morte, Justiça autorizou registro oficial do nome de paciente em coma por 24 anos

Clarinha: Um dia antes da morte, Justiça autorizou registro oficial do nome de paciente em coma por 24 anos



Será feita solicitação judicial para que a certidão de óbito seja lavrada em nome de Clarinha, contendo informações como o local definitivo do sepultamento do corpo, além do registro fotográfico e papiloscópico.

Quem é Clarinha

O local exato do atropelamento e o veículo que atingiu a mulher nunca foram identificados, segundo a polícia. Ela foi socorrida por uma ambulância, mas não possuía documentos. Clarinha chegou ao hospital já desacordada e sem ser identificada.

A mulher estava internada em estado vegetativo no Hospital da Polícia Militar (HPM), em Vitória. Nenhum parente ou amigo a visitou em todos esses anos.

Médico que cuidou de Clarinha por mais de duas décadas, coronel Jorge Potratz, espírito santo — Foto: Reprodução TV Gazeta

Corpo ainda está no DML

Neste sábado (16), o médico que cuidou da paciente por mais de duas décadas, o coronel Jorge Potratz, disse ao g1 que ficou surpreso com a autorização do nome de Clarinha.

"O Ministério Público soltou uma nota, a gente não estava sabendo disso e não deu tempo de efetivar essa situação. Pelo menos ela consegue sair com uma declaração", pontuou o médico.

Ele disse que após a morte, surgiu um homem no Departamento Médico Legal (DML) de Vitória que acredita ser filho de Clarinha e solicitou o DNA.

"Como o DML tem apenas possibilidade de fazer comparação com impressões digitais, e Clarinha não as tem, será necessário exane de DNA. Todo esse procedimento pode atrasar a liberação do corpo", explicou.

O registro civil

O MP-ES informou que realizou um intenso trabalho por anos para buscar familiares ou conhecidos da paciente.

"No ano de 2022, as demandas relacionadas a Clarinha passaram a ser encaminhadas ao Promotor de Justiça Cível de Vitória em razão da necessidade de confeccionar o registro civil de nascimento, para que fosse reconhecida juridicamente sua existência, garantindo-lhe o atendimento junto à área da saúde em instituições e órgãos públicos. Deu-se início, então, à ação judicial em setembro de 2022, e, na quarta-feira (13), o Juízo da 2ª Vara da Fazenda Pública Estadual e Municipal, Registros Públicos, Meio Ambiente e Saúde de Vitória julgou procedente o pedido “para determinar que seja lavrado o assento de nascimento tardio da pessoa apelidada por “Clarinha”, no Cartório de Registro Civil ”, com os demais dados necessários", diz a nota.

A Promotoria de Justiça disse ainda que através da imprensa soube que “Clarinha” havia morrido na quinta-feira (14), um dia depois da autorização do registro civil.

"Diante da situação, foi feito contato com servidores do Hospital da Polícia Militar do Espírito Santo para dar conhecimento da ação judicial e solicitar esclarecimentos sobre a pessoa que será responsável pela autorização judicial de liberação do corpo, sepultamento e demais providências relacionadas ao óbito", explicou o MP.

Clarinha ficou em coma em hospital de Vitória 24 anos. — Foto: TV Gazeta

O órgão informou que vai continuar prestando todo auxílio quanto ao pedido em questão. O coronel Potratz, médico que cuidou de Clarinha ao logo desses anos, ficará responsável pelas burocracias.

Ele se prontificou em ser responsável pelo pedido de autorização judicial para liberação de corpo, sepultamento e demais providências relacionadas ao óbito. Por esta razão, o MP-ES acredita Clarinha não será enterrada como indigente.

"Será feita solicitação judicial para que sua certidão de óbito seja lavrada em nome de Clarinha, contendo informações como o local definitivo do sepultamento do corpo, além do registro fotográfico e papiloscópico dela, a fim de viabilizar eventuais esclarecimentos caso surja, no futuro, fato novo. Inclusive, será solicitada a coleta de material genético para eventuais exames", explicou.

Buscas por grau de parentesco

De acordo com o Ministério Público, um dia após a morte de Clarinha, somente na sexta-feira (15), três famílias entraram em contato o órgão manifestando interesse na realização de exame de DNA com Clarinha a fim de confirmar possível parentesco. O Ministério Público buscou junto aos órgãos competentes auxílio com relação a essas demandas.

Segundo o MP, durante muitos anos, por meio do Grupo Especial de Trabalho Social (Getso), atuou em diversas frentes, expedindo ofícios, fazendo diligências e cobrando perícias. Após a extinção do Getso, os trabalhos de investigação tiveram continuidade com a 28ª promotora de Justiça Cível de Vitória, que adotou diversas providências, expandindo o espectro de busca pela identificação.

Mais de 102 famílias procuraram o MP-ES tentando identificar Clarinha como uma possível parente desaparecida.

Desse total, 22 casos chamaram mais atenção, pelas fotos ou pela similaridade dos dados próximos ao perfil pretérito de Clarinha. Depois de uma triagem mais detalhada, quatro casos foram descartados, devido à incompatibilidade de informações ou pelo fato de as pessoas procuradas já terem sido encontradas.

O MP-ES dividiu as 18 pessoas restantes em dois grupos para a realização dos exames de DNA. No entanto, os resultados mostraram-se incompatíveis para traços familiares.

Internada há mais de 20 anos no HPM, Clarinha não é a menina que desapareceu no ES em 1976

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Morte após 24 anos

Clarinha ficou internada em coma por 24 anos em hospital de Vitóra — Foto: Reprodução/ TV Gazeta

O coma da paciente não identificada era considerado elevado. “A gente classifica o coma em uma escala de três a quinze pontos. Quinze é o paciente acordado e lúcido e três é o coma mais profundo. Ela não tem nenhum contato com a gente e por isso a gente considera um coma de sete para oito”, explicou o médico aposentado.

Clarinha foi atropelada no Dia dos Namorados, em 12 de junho de 2000, no Centro de Vitória. A mulher foi socorrida por uma ambulância, mas não possuía documentos, chegou ao hospital já desacordada e sem ser identificada.

Inicialmente, Clarinha foi levada para o Hospital São Lucas. Um ano depois, foi transferida para o Hospital da Polícia Militar, também na capital, onde permaneceu até o final da vida.


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