Dono de posto de combustíveis é condenado por uso consciente de bomba defeituosa, em Porto Velho

Dono de posto de combustíveis é condenado por uso consciente de bomba defeituosa, em Porto Velho

 


Porto Velho, RO - Sentença do Juízo da 3ª Vara Criminal da Comarca de Porto Velho-RO condenou o proprietário de um posto de combustíveis (localizado na Zona Leste da capital) sob acusação de ter praticado o crime contra a ordem econômica. O réu, que é reincidente na ação penal nº 0011352-35.2011.8.22.0501, com trânsito em julgado dia 4 de maio de 2018, cumprirá uma pena de um ano e dois meses de detenção, em regime inicial semiaberto.

Segundo a sentença, o acusado, mesmo tendo conhecimento, utilizava uma bomba com defeito para abastecer veículos causando, com essa atitude, prejuízo aos clientes, pois, durante a fiscalização pela Agência Nacional de Petróleo, Gás Natural e Biocombustíveis (ANP), foram feitos três testes (disparos com a bomba) de vinte litros, e, em todos, o resultado foi menor que as quantidades de combustíveis estabelecidas nos abastecimentos.

A negligência foi descoberta pela ANP, no dia 16 de abril de 2009. O caso foi levado ao Ministério Público de Rondônia, que denunciou o empresário pelos crimes contra o consumidor e contra a ordem econômica. Com relação ao crime contra o consumidor (art. 66, da Lei 8.078/90), a punibilidade foi extinta em razão da prescrição: o fato ocorreu em 2009 e a denúncia foi ofertada no dia 19 de novembro de 2019. Durante o evento fiscalizador não foi encontrado adulteração de combustíveis. O acusado registra condenação criminal nos autos n. 0010991-52.2010.8.22.0501, com sentença proferida em 29 de janeiro de 2018.

A sentença condenatória foi publicada no Diário da Justiça do dia 24 de julho de 2023.

Ação Penal n. 0016036-66.2012.8.22.0501.

PODER JUDICIÁRIO DO ESTADO DE RONDÔNIA 
Tribunal de Justiça de Rondônia
Porto Velho - 3ª Vara Criminal 
Avenida Pinheiro Machado, nº 777, Bairro Olaria, CEP 76801-235, Porto Velho 

Número do processo: 0016036-66.2012.8.22.0501

Classe: Ação Penal - Procedimento Ordinário

Polo Ativo: Ministério Público do Estado de Rondônia

ADVOGADO DO AUTOR: MINISTÉRIO PÚBLICO DO ESTADO DE RONDÔNIA

Polo Passivo: HAROLDO RATES GOMES NETO

ADVOGADO DO DENUNCIADO: ANTONIO RERISON PIMENTA AGUIAR, OAB nº RO5993

 

SENTENÇA

 

Vistos.

FRANCISCO DE LOIOLA SILVA, qualificado nos autos, foi denunciado pelo Ministério Público como incurso nas penas do artigo 1º, I, da Lei 8.176/1991, e artigo 66 do Código de Defesa do Consumidor.

Consta na inicial que, em 16 de abril de 2009, no estabelecimento RATES E RATES COMÉRCIO DE DERIVADOS DE PETRÓLEO LTDA., de propriedade do réu HATOLDO RATES GOMES NETO, comercializou combustível em desacordo com as especificações técnicas da Agência Nacional de Petróleo Gás Natural e Biocombustíveis – ANP, tendo, ainda, atentado contra as normas do consumidor.

Ainda conforme a denúncia, por ocasião da ação fiscalizadora realizada pela Agência Reguladora de Petróleo - ANP, constatou-se que uma das bombas abastecedoras de combustível do posto pertencente ao denunciado, notadamente a de Álcool Etílico Hidratado Comum – AEHC, era utilizada apesar da imprecisão em sua vazão, sento então detectadas as seguintes impropriedades:

1) bico n° 02, série PG0825/2008 GILBARCO, ao realizar três disparos de 20 (vinte) litros, depositou somente a respectiva quantidade, quais sejam: 1) 19,860 (-140 ml); 2) 19,840 (- 160ml) e 3) 19,870 (-130 ml), no entanto, a tolerância permitida para menos é de apenas 0,100 litros, oportunidade em que foi lavrado Auto de Infração n° 295670 – 09/16.

A denúncia foi recebida em 19/11/2019 (Id. 72893688, pag. 6).

O réu foi citado pessoalmente e apresentou resposta à acusação no Id. 72893688, pag. 22.

Em audiência de instrução foi inquirida a testemunha THIAGO ROCHA LADEIRA (fiscal da ANP), sendo também interrogado o denunciado.

Não houve pedido de diligências complementares pelas partes.

Em sede de memoriais, o Ministério Público requereu a condenação do acusado, nos moldes da denúncia.

A Defesa, por sua vez, alegou ausência de culpa e dolo, além da insignificância da conduta. Arguiu, ainda, ausência de provas da adulteração da bomba de combustível, além da prescrição.

É o relatório. DECIDO.

Trata-se de ação penal destinada a apurar os crimes definidos no artigo 1º, I, da Lei 8.176/1991 e artigo 66 do Código de Defesa do Consumidor, que assim dispõem:

 

Lei 8.176/91:

Art. 1° Constitui crime contra a ordem econômica:

I - adquirir, distribuir e revender derivados de petróleo, gás natural e suas frações recuperáveis, álcool etílico, hidratado carburante e demais combustíveis líquidos carburantes, em desacordo com as normas estabelecidas na forma da lei;

II - (...)

Pena: detenção de um a cinco anos.

 

CDC:

Art. 66. Fazer afirmação falsa ou enganosa, ou omitir informação relevante sobre a natureza, característica, qualidade, quantidade, segurança, desempenho, durabilidade, preço ou garantia de produtos ou serviços:

Pena - Detenção de três meses a um ano e multa.

 

- Do crime contra o consumidor:

Quanto ao crime tipificado no artigo 66 da Lei 8.078/90, verifica-se que foi alcançado pela prescrição da pretensão punitiva.

O delito em referência possui pena abstrata cominada de detenção de 3 (três) meses a 1 (um) ano e multa, de modo que a prescrição ocorrerá no lapso de 4 (quatro) anos, conforme previsão do artigo 109, V, do Código penal.

No caso, o fato teria ocorrido em 16 de abril de 2009 (antes das alterações promovidas pela Lei 12.234/2010) e a denúncia recebida em 19/11/2019 (Id. 72893688, pag. 6). Portanto, neste ínterim, o delito prescreveu em 16 de abril de 2013Portantoencontra-se extinta a punibilidade.

 

- Do crime contra a ordem econômica:

Inicialmente, afasto a tese de insignificância apresentada pela defesa, tendo em vista que não se tratava de conduta isolada, já que o réu tinha conhecimento dos constantes problemas apresentados pelos equipamentos e, ainda, assim, deixou de providenciar a devida assistência técnica, de modo que a sua conduta atingiu verdadeira coletividade de consumidores lesados.

Sobre o tema, cita-se o julgado abaixo:

 

PENAL E PROCESSO PENAL. AGRAVO REGIMENTAL NO HABEAS CORPUS. CRIME DO ART. 1º, I, DA LEI N. 8.176/1991. NORMA PENAL EM BRANCO. RESOLUÇÃO N. 9/2007 DA ANP. REVOGAÇÃO DA EXIGIBILIDADE DE COLETA DE AMOSTRAS-TESTEMUNHA. FACULDADE DO REVENDEDOR-VAREJISTA. PLEITO DE RECONHECIMENTO DE ABOLITIO CRIMINIS. IMPOSSIBILIDADE. VENDA DE COMBUSTÍVEL EM DESACORDO COM AS DETERMINAÇÕES LEGAIS. CONDUTA QUE SE SUBSUME AO TIPO PENAL INDEPENDENTEMENTE DA COLETA OU GUARDA DA AMOSTRA-TESTEMUNHA. PRECEDENTES DESTA CORTE QUE NÃO SE APLICAM AO CASO. INSIGNIFICÂNCIA PENAL NÃO CONFIGURADA. CRIME CONTRA A ORDEM ECONÔMICA. REITERAÇÃO DELITIVA. PEDIDO DE ABSOLVIÇÃO. INVIABILIDADE DO REVOLVIMENTO FÁTICO-PROBATÓRIO DOS AUTOS. 1. (...) 6. O princípio da insignificância deixou de ser reconhecido pela Corte de origem em razão do entendimento de que a conduta da agravante se revestiu de potencialidade lesiva para afetar a saúde pública, o meio ambiente e os veículos automotores, o que afastaria a insignificância penal. Por certo, não se pode considerar como insignificante a conduta que ofende a ordem econômica e pode causar danos à saúde pública e ao meio ambiente. 7. Esta Quinta Turma reconhece que o princípio da insignificância não tem aplicabilidade em casos de reiteração da conduta delitiva, salvo excepcionalmente, quando demonstrado ser tal medida recomendável diante das circunstâncias concretas, o que não ocorreu. Quanto ao fundamento de que a agravante foi absolvida nas ações penais mencionadas no acórdão impugnado, não há manifestação prévia da instância ordinária sobre o tema, tampouco há prova pré-constituída da defesa que comprove tal afirmação. 8. (...) 9 . Agravo regimental desprovido. (STJ - AgRg no HC: 704601 RJ 2021/0354652-6, Data de Julgamento: 17/10/2022, T5 - QUINTA TURMA, Data de Publicação: DJe 20/10/2022)

 

Também não é o caso de prescrição da pretensão punitiva, tendo em vista que entre os marcos interruptivos não transcorreu mais de 12 (doze) anos necessários à consumação da prescrição para o aludido delito, que possui pena máxima abstrata de detenção de 5 (cinco) anos (art. 109, III, CP).

No mais, materialidade delitiva encontra-se suficientemente comprovada com o Auto de Infração/Interdição expedido pela Agência Nacional do Petróleo – ANP (Id. 72893685, págs. 10/16), no qual consta que a bomba de combustível da série PG0825/2008 GILBARCO, após ser verificada por 03 (três) vezes, estava disparando combustível em quantidade menor que a informada ao consumidor.

Ademais, como bem esclarecido pelo fiscal da ANP THIAGO ROCHA, arrolado como testemunha do Ministério Público, foram realizados três testes para averiguar possíveis inconsistências e em todos eles o resultado foi que a referida bomba de combustível depositou quantidade em desconformidade com os regulamentos que regem a atividade de venda de combustível.

conduta, portanto, é típica.

Em relação à autoria, é certa e recai sobre HAROLDO RATES GOMES NETO, proprietário do estabelecimento à época do fato. Nessa condição tinha o dever de utilizar equipamentos em condições técnicas regulares para a venda de combustível, contudo, assim não o fez.

Em seu interrogatório, o réu disse que as bombas de combustíveis eram velhas e sempre acontecia esse mesmo problema narrado na denúncia, sendo que costumavam chamar os responsáveis pela assistência técnica para os reparos necessários. Contudo, desta vez que a fiscalização da ANP esteve no estabelecimento em questão, não tinha sido providenciado o reparo nas bombas do posto, dando ensejo à irregularidade detectada.

Das declarações do réu extrai-se que agiu, no mínimo, com dolo eventual ao permitir o funcionamento de equipamento fora das normas específicas que regem o postos de combustíveis. Tanto que, não fosse a fiscalização da ANP, não se descarta que o estabelecimento do acusado continuasse comercializando o combustível nas mesmas condições da infração detectada pela aludida Autarquia, ou seja, em franco prejuízo ao consumidor.

prova testemunhal fortalece a constatação da autoria, pois o fiscal da ANP THIAGO ROCHA, responsável pela fiscalização, esclareceu que no estabelecimento foi detectada a imprecisão nas bombas de combustível. Informou que existe uma tolerância de 100mls para mais ou para menos na diferença em bombas dessa naturezaNo entanto, a divergência identificada foi de menos 140, menos 160 e menos 130. Foram feitas 3 (três) verificações sequenciais em um único dia e todas confirmaram a irregularidade. A bomba estava em funcionamento. Essa imprecisão pode ser decorrente de uma falha mecânica, mas são orientados a realizar essa verificação semanalmente. Houve procedimento administrativo na ANP. Não houve constatação de adulteração de combustível.

Destaca-se que a diferença apurada pela ANP como disparada a menor, é muito superior ao permitido, chegando a mais de 100ml a menos do que o apontado na bomba, ou seja, é evidente a prática do ilícito com o único objetivo de aferir vantagem econômica em detrimento do consumidor.

Portanto, as provas dos autos são suficientes para afirmar que o acusado praticou o crime tipificado no art. 1º, I, da Lei 8.176/1991, e por ele deve ser responsabilizado.

Não se vislumbra nos autos qualquer excludente de ilicitude ou dirimente de culpabilidade.

 

Dosimetria da pena.

Culpabilidade normal para o tipo. Registra condenação criminal nos autos 0010991-52.2010.8.22.0501Não há nos autos informações quanto à conduta social, personalidade do réu, tampouco quanto aos motivos da prática do delito. As circunstâncias e consequências são normais à espécie, e a vítima em nada contribuiu para sua ocorrência.

Assim, nos termos do artigo 59 do Código Penalfixo-lhe a pena base em 1 (um) ano 2 (dois) meses de detenção e 11 (onze) dias-multa.

Presente a circunstância atenuante da confissão, porém, a compenso com a reincidência decorrente da condenação nos autos da ação penal n.º 0011352-35.2011.8.22.05.01, com trânsito em julgado em 04/05/2018. Desta forma, mantenho a pena intermediária em 1 (um) ano, 2 (dois) meses de detenção e 11 (onze) dias-multa.

Não há causa de aumento ou de diminuição a considera, de modo que torno definitiva a pena de detenção de 1 (um) ano 2 (dois) meses de detenção e 11 (onze) dias-multa.

Fixo o valor do dia multa em 1/30 do salário-mínimo vigente ao tempo do fato (2009)equivalente a R$ 15,50 (quinze reais e cinquenta centavos), totalizando R$ 170,50 (cento e setenta reais e cinquenta centavos).

Condeno-o ao pagamento das custas processuais no valor de R$ 674,94 (seiscentos e setenta e quatro reais e noventa e quatro centavos).

A pena deverá ser cumprida em regime semiabertoem razão da reincidência, conforme disposto no artigo 33, §2º, “c”, do Código Penal.

Deixo de substituir a pena em virtude da reincidência e por não encontrar fundamentos para enquadrar em socialmente recomendável.

O réu está solto por este processo e assim poderá aguardar até o trânsito em julgado.

 

Dispositivo

Diante do exposto, JULGO PARCIALMENTE PROCEDENTE o pedido constante na denúncia para:

(i) condenar FRANCISCO DE LOIOLA SILVAqualificado nos autos, como incurso nartigo 1º, I, da Lei 8.176/1991a uma pena de 1 (um) ano 2 (dois) meses de detenção e 11 (onze) dias-multa, a ser cumprida em regime inicial semiaberto;

(ii) decretar a extinção da punibilidade de FRANCISCO DE LOILA SILVA, quanto ao crime do art. 66 da Lei 8.078/1990, em razão da prescrição da pretensão punitiva (art. 109, V, e art. 107, IV, ambos do Código Penal).

Intime-se as partes desta sentença, bem como para que se pronunciem acerca da prescrição retroativa.

Após, venham-me conclusos os autos para demais deliberações acerca da execução, acaso não configurada a prescrição retroativa.

 

Publique-se. Registre-se. Intime-se.

 

Porto Velho, 21 de julho de 2023.

 

Ângela Maria da Silva

Juíza de Direito Substituta

 

Assinado eletronicamente por: ANGELA MARIA DA SILVA
21/07/2023 10:19:20
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